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violência doméstica

deFEMders barram privatização de Centros de Referência da Mulher

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As deFEMders Marina Carvalho Marcelli Ruzzi e Tainã Góis obtiveram a suspensão de Edital de Chamamento Público nº CPB/009/2021/SMDHC/COM, lançado pela Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania, que objetivava a celebração de parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para gestão dos Centros de Referência da Mulher nas regiões Norte, Sul e Central do município de São Paulo.

A manobra, em suma, viabilizava a privatização de Centros de Referência da Mulher em São Paulo, terceirizando o atendimento da mulher vítima de violência. O anúncio do Edital provocou manifestação técnica da Rede Feminista de Juristas – deFEMde, elaborada pelas deFEMders Amanda Vitorino, Cristiane Ávalos, Carolina Stuchi, Elaini Silva, Marina Ruzzi e Tainã Góis., que pode ser conferida aqui.

As irregularidades presentes em Edital foram pautadas em representação feita pelas deFEMders ao Tribunal de Contas do Município de São Paulo – TCM. Dentre os problemas encontrados, estão a falta de audiência pública e diálogo com a sociedade a respeito, inclusive, da organização de sociedade civil – OSC selecionada para a gestão de dois dos lotes, a Associação de Auxílio Mútuo da Região Leste – OS APOIO. Considerando o volume de irrgularidades encontradas, as deFEMders pleitearam ao órgão que suspendesse o Edital de Chamamento.

A arguição das deFEMders foi referendada pela Subsecretaria de Fiscalização e Controle – SFC do Tribunal, que também pautou a falta de previsão para a contratação de profissionais da área jurídica e agentes de segurança, a ausência de estudo técnico detalhado sobre as necessidades dos três Centros de Referência de Atendimento à Mulher objeto de Edital, de planilha de valores sem detalhamento ou embasamento, a insuficiência na previsão de psicólogas no plano de trabalho, a obscuridade sobre a supervisão dos trabalhos e a ausência de parâmetros aplicados no cumprimento das metas.

Diante das alegações das deFEMders e do relatório da SFC, o Tribunal de Contas do Município determinou a suspensão do Chamamento Público nº CPB/009/2021/SMDHC/CPM e a abstenção, pela Municipalidade, de firmar parcerias neste sentido. A decisão é uma vitória para as mulheres em São Paulo, e coloca em xeque a política deliberada de sucateamento dos equipamentos da Administração Direta municipal de enfrentamento à violência contra a mulher. Confira a decisão aqui.

Tainã Góis é cofundadora da Rede Feminista de Juristas – deFEMde, advogada trabalhista e pesquisadora com foco em Direito do Trabalho, Gênero, Sociologia do Trabalho, Epistemologia Jurídica; Marina Ruzzi é integrante da Rede Feminista de Juristas – deFEMde, advogada e Mestra em Gestão de Políticas Públicas pela Universidade de São Paulo; Amanda Vitorino é Liderança em Mobilização Estratégica e Auxiliar em Comunicação da Rede Feminista de Juristas – deFEMde e especializada em Impactos Sociais pelo Amani Institute; Cristiane Ávalos dos Santos é integrante da Rede Feminista de Juristas – deFEMde, advogada civilista e social media no Curso Popular Defensoria; Carolina Gabas Stuchi é integrante da Rede Feminista de Juristas – deFEMde e professora adjunta da Universidade Federal do ABC; Elaini Cristina Gonzaga da Silva é integrante da Rede Feminista de Juristas – deFEMde e Doutora em Direito Internacional pela Faculdade de Direito da USP.

Parabenizamos as deFEMders pela rápida articulação e intervenção em defesa das vítimas de violência do estado de São Paulo. E seguimos deFEMdendo.

deFEMde fala do crime de perseguição, ou stalking

1024 683 Rede Feminista de Juristas

Reportagem originalmente publicada pela Revista Istoé. Para acessar o conteúdo, clique aqui.

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde conversou com Vinicius Mendes, jornalista, sobre a tipificação do crime de perseguição no Brasil, que criminaliza a prática conhecida como stalking.

stalking tem raízes na caça de animais; é daí que o termo se deriva em inglês. A prática consiste em rastrear, encurralar e/ou ameaçar uma pessoa, no meio físico, ou no meio virtual. Vítimas de stalking (ou perseguição) costumam receber telefonemas sem identificação insistentemente (a ligação é comumente encerrada no segundo em que atendem), ter a caixa de entrada e a caixa de spam sempre lotadas de mensagens dos agressores, receber notificações frequentes sobre mudanças (que elas não fizeram) de senha em redes sociais e aplicativos (sinalizando tentativas de hack do agressor), muitos comentários de uma mesma pessoa ou de perfis ocultos com escrita similar em diversas postagens suas em redes sociais (independentemente se o conteúdo da postagem é escrito, ou audiovisual; essa frequência e insistência de comentários sinaliza a presença do agressor em suas redes sociais); estas vítimas também podem identificar imagens suas em momentos mais íntimos (na piscina de casa com a família, por exemplo) roubadas de stories, feeds, reels e outrose postadas em outras redes sociais pelos agressores (sinalizando o nível de acesso que o stalker tem sobre a vítima, independentemente dos níveis de restrição que esta imponha sobre seus dados), ou ver deep fakes seus em circulação e dados sensíveis como CPF, conta bancária, chaves de segurança de cartão de crédito e outros expostos na internet sem explicação (sinalizando agressores engajados em violência psicológica, espalhando ofensas sobre a vítima e estimulando mensagens de ódio contra ela, buscando seu constrangimento e isolamento). 

Os stalkers rastreiam e assediam as vítimas mais facilmente pela internet, e atingem também pessoas próximas. Agressores se aproximam de amigos e familiares das vítimas para coletar informações sensíveis (endereço, CPF, dados bancários, status de relacionamento, dentre outros) e para ameaçá-los, afastando estas pessoas das vítimas; eles também podem obter estes dados usando suas ferramentas de trabalho (como atendentes de SAC e outros serviços, com acesso a cadastros de usuários e visualização de informações da vítima). Em casos mais severos, o stalker pode investir fisicamente contra a vítima, seguindo-a na rua, invadindo sua propriedade e tentando a prática de qualquer (outro) tipo de violência contra a vítima. É o caso da gamer Sol.Qualquer mulher pode ser vítima de stalking; por isso, apesar de serem detectadas algumas ocorrências tendo homens como vítimas, o stalking é tratado como uma das formas de violência contra as mulheres. Haru e Sol são casos emblemáticos da perseguição de homens que acreditavam ter algum tipo de “direito” às vidas delas; o relato de Adriana Falcão segue na mesma linha. A aproximação do stalker geralmente não é percebida, pois o contato inicial se dá de forma cordial, em interações controladas como a visita do técnico da NET, nas quais não se depreende perigo; é importante não culpabilizar a vítima e responsabilizar energicamente o agressor, e as estruturas que facilitam estas práticas. O stalker acredita que merece um contato mais íntimo, e que seus esforços para obter esse contato são justificados. Este é o padrão de educação masculina. Homens são educados para não medirem esforços, para ignorar o “não” e interpretar qualquer sinal como um “sim“.  Todas as mulheres estão sujeitas a este crime. O agressor, no entanto, tem um perfil certeiro. 

A Lei de Stalking não substitui norma anterior – isso não era normatizado antes. O que ocorria é que a prática poderia ser enquadrada em contravenção penal (a perturbação de sossego), e isso, com muito boa vontade dos sistemas de Justiça, que comumente ignoravam os pedidos de ajuda das vítimas. Não podemos afirmar que a revogação do dispositivo por esta norma caracteriza substituição. Com a Lei 14.132/2021, as vítimas de perseguição tem amparo legal específico e não dependem dessa boa vontade.  A norma acolhe uma demanda de muito tempo das mulheres para o combate às violências de gênero, e vemos à menção expressa à discriminação de gênero como algo positivo. Se a norma viesse 5 anos antes, Sol estaria viva e Haru não teria passado pelo horror que passou; muitas mulheres não teriam pavor de visitas técnicas da NET, se tivéssemos essa norma antes. Ter amparo legal muda totalmente o jogo para mulheres nas redes sociais.  O número de registros da ocorrência em poucos meses da vigência mostra que as vítimas de perseguição começam a sentir que podem procurar ajuda e que estão se fortalecendo com o reconhecimento do que é feito contra elas como crime. 

Antes, havia a possibilidade de se enquadrar o stalking na perturbação de sossego, prevista pelo art. 65 da Lei de Contravenções Penais. O dispositivo era um guarda-chuva para uma série de reclamações do cotidiano (barulho, odores de canis e outros), e por isso naturalizado pelos sistemas de Justiça, que comumente não registravam a ocorrência; se registravam, não davam seguimento, ou demoravam demais para pautar o tema, permitindo que os agressores saíssem impunes, como ocorreu com Haru. Departamentos destinados à proteção da mulher não pautavam a conduta fora de relações afetivas, familiares ou inseridas em unidade doméstica, por entender que não havia amparo legal dessas vítimas. Em departamentos que pautam crimes online, as mulheres também não obtinham acolhimento. Não podemos falar em dificuldades com um quadro desses; apenas em impossibilidade. Conseguir justiça nestes casos era tarefa de Sísifo.

stalking é uma prática muito antiga. Os casos não cresceram; eles só estão sendo mais denunciados, filmados, expostos nas redes sociais, mas não surgiram ontem. Como dizia o filme da Disney: a tale as old as time. Estamos no Julho das Pretas, e precisamos lembrar que Maria Beatriz Nascimento, historiadora, professora, roteirista e poeta negra, foi vítima fatal de stalking nos anos 90. Também é possível afirmar, considerando o contexto do caso, que Daniella Perez foi uma vítima fatal de stalking. As consequências da inexistência de uma norma que dê alguma proteção legal às vítimas dessa prática e a constatação da inércia do Estado ante à violação de Direitos Humanos aqui contida é que exigem a formulação de norma específica. Precisamos lembrar que a perseguição também integra os relacionamentos abusivos; no âmbito afetivo e familiar, a prática integra os dispositivos da Lei Maria da Penha. Muitas mulheres foram – e são – perseguidas por seus companheiros e ex-companheiros, e à época, não tiveram resposta dos sistemas de Justiça por não sofrerem “violência física”. Grande parte destas mulheres hoje integra estatísticas de feminicídio, tentado ou consumado. E grande parte destas mulheres poderia estar viva hoje, se tivesse amparo legal quando entrou na delegacia pela primeira vez com fotos e filmagens do agressor seguindo rua afora e os dizeres “ele me persegue em todos os lugares que eu vou“. 

Muitos casos não são denunciados.  É importante considerar que, mesmo com a tipificação específica, o receio de represálias dos agressores, aliado ao cenário de violência institucional de gênero constatado em setores de atendimento às mulheres vítimas de violência, desestimulam as vítimas de buscar a ajuda necessária, consolidando o quadro nefasto das cifras ocultas nos dados de segurança pública no país. É necessário um diálogo franco sobre como as instituições podem se tornar mais acessíveis às mulheres e dar plena segurança de acolhimento quando da decisão de denunciar um crime.

O Brasil está bastante atrasado. EUA,  grande parte da União Europeia, Reino Unido, África do Sul, Japão, e outros países possuem legislação anti-stalking. A legislação, ainda que falha (condicionando a representação da vítima e forçando uma revitimização, neste aspecto) é importante, pois permitirá um debate qualificado sobre os números de stalking no Brasil, mesmo com as cifras ocultas que infelizmente permeiam os dados de segurança pública, a elaboração de políticas públicas de combate a esta prática, a inclusão do problema em programas de compliance de grandes empresas e possibilita um esforço para a promoção de equidade de gênero e no gênero para o Brasil. Temos uma oportunidade. resta saber se conseguimos aproveitar.

deFEMde fala de violência patrimonial e pandemia

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Reportagem originalmente publicada no portal iG Delas. Para acessar o conteúdo, clique aqui.

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde conversou com Luciana Teixeira Morais, jornalista, sobre um tema bastante delicado: a negativa do auxílio emergencial para mulheres que se separaram durante a pandemia. O benefício costuma ser negado com a justificativa de que outra pessoa da família recebe o auxílio.

A subtração do Auxílio Emergencial após o fim do relacionamento caracteriza violência patrimonial. A violência patrimonial é a retenção, subtração, destruição parcial ou total de dados, objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos da mulher como forma de forçar dependência e manter uma condição de subserviência dentro do relacionamento. A violência patrimonial é tipificada pelo art. 7º, IV da Lei Maria da Penha, mas ainda temos dificuldades na aplicabilidade disso pelo estigma que isso carrega (a mulher é sempre culpada e culpabilizada; há uma presunção de que ela nunca seja vítima de um golpe, mas sim sua arquiteta). Usar o CPF para fazer compras e não pagá-las, impedir o trabalho, destruir computadores, mexer no WhatsApp (mesmo que seja pessoal, pode ter contatos de trabalho) sem autorização, enfim, todas estas são condutas que também podem ser inseridas na violência patrimonial.

Há um padrão nocivo de ex-companheiros e ex-cônjuges, que cadastram deliberadamente os filhos como dependentes, mesmo sendo as mulheres as principais provedoras das crianças e adolescentes envolvidos, para receber o Auxílio Emergencial. Eles não enxergam o Auxílio como um direito delas, que não se relaciona com os alimentos a serem prestados às crianças e adolescentes frutos do relacionamento. Os ex-companheiros e ex-cônjuges adotam essa prática em caráter punitivo, para que as mulheres sintam o peso de não tê-los por perto, e em caráter compensatório, como se precisassem de um prêmio por cumprir com funções parentais.

Quando essa violência se manifesta no âmbito de famílias inseridas no CadÚnico – que é um programa assistencial destinado a famílias periféricas – recebendo Auxílio Emergencial, há uma participação do Estado na consolidação dessas violências, pois a família recebe conjuntamente. Os dados são cadastrados em bloco, e a mudança no relacionamento, mesmo formalizada, não produz atualizações na base de dados. Essa falta de atualização incentiva a violência patrimonial, já que cônjuges e companheiros subtraem o Auxílio Emergencial e impõem condições às companheiras e cônjuges para devolução ou repasse da cota-parte.

Para tentar remediar a situação, estas mulheres são obrigadas a se dirigirem às unidades responsáveis pelo CadÚnico, e enfrentarem horas em aglomerações, expostas a COVID-19, para retificar uma informação e manter uma base mínima de sustento – e por vezes recebem negativas esdrúxulas dos responsáveis na retificação.
Ao não atualizar bases de dados e exigir esse comparecimento, sujeitando pessoas à exposição a COVID-19, o Estado basicamente força uma escolha brutal: arriscar a vida, ou permanece em situação de violência. Entendemos assim uma cumplicidade do Estado na manutenção das desigualdades de gênero, e uma contribuição ativa na continuidade da violência doméstica. Quando se fala em necropolítica, esta situação é mais uma das que desenha bem o que se quer dizer. É assim que se decide quais vidas são valiosas e quais vidas são descartáveis. Mulheres periféricas, geralmente inseridas em recortes raciais e comumente chefes de família, ficam extremamente vulneráveis no momento em que mais precisam de apoio das famílias, da sociedade e do Estado.

Em alguns estados, existem demandas que tentam contornar o problema, mas não diretamente. No Pará e em São Paulo, órgãos ministeriais buscaram judicialmente a atualização automática de bases de dados, ou a dispensa de visita presencial a unidades de atualização, o que facilitaria a vida de muitas mulheres; mas as ações não fazem estes pedidos em função delas. O recorte de gênero, embora conhecido destes órgãos, é ignorado. A jurisprudência, neste sentido, não será conhecida do publico, e acompanhar sua evolução será difícil; estas são demandas atinentes ao Direito das Famílias, e processos familiares correm em segredo de justiça por lei. Existe uma possibilidade grande uma termos já um desenho nefasto de jurisprudências favoráveis aos ex-companheiros e ex-cônjuges engajados em violência patrimonial durante a pandemia, quadro que levará anos para ser revertido no Brasil, algo bem semelhante ao quadro da Lei de Alienação Parental.

deFEMde apoia transporte público gratuito para mulheres em situação de violência

1024 683 Rede Feminista de Juristas

Nos últimos anos, no âmbito federal, diversas tentativas de modificação da Lei Maria da Penha têm sido objeto de discussão, mas poucas delas têm a capacidade de gerar real impacto na vida das mulheres, já que não enfocam em fortalecer a rede de serviços de atenção e atendimento à mulher em situação de violência – a qual, se robusta, multidisciplinar e orientada por noções de direitos humanos das mulheres, pode ser decisiva ao propiciar condições para que mulheres encontrem caminhos para sair do ciclo da violência doméstica e/ou intrafamiliar. 

Embora seja fundamental que haja a coordenação, a formulação e a execução de políticas públicas em âmbito federal, é certo que Poderes Municipais também podem se mobilizar para contribuir para o aperfeiçoamento da rede. Um ótimo exemplo desse tipo de iniciativa é a proposta presente no Projeto de Lei Municipal (São Paulo) nº 01-00124/2017, que estabelece, no âmbito do Município de São Paulo, às mulheres que tenham sido vítimas de violência, o direito a ficarem temporariamente dispensadas do pagamento de tarifa no transporte público municipal. 

É sabido que, em muitos casos, a situação de violência doméstica e/ou intrafamiliar atua como um vetor de vulnerabilidade, afetando drasticamente a vida das mulheres e o exercício de seus direitos. Medidas que visam a reconectar as mulheres com espaços de sociabilidade e impulsionam o aprofundamento ou reconstrução de sua autonomia são fundamentais. Por isso, é mais que desejado pensar em novas formas de tornar o mundo um lugar mais acolhedor para mulheres em situação de violência. 

Em uma cidade da magnitude de São Paulo, propiciar melhor mobilidade pode ser fundamental para facilitar o acesso a serviços da rede de apoio, o acesso à justiça e o acesso a oportunidades de trabalho, educação, cultura e lazer, especialmente para mulheres que se encontram em situação de dependência econômica. 

É por tais motivos que a Rede Feminista de Juristas, por meio desta nota, manifesta seu apoio à aprovação e sanção do projeto de lei.

deFEMde trata proposta da câmara sobre concessão de protetivas em delegacia

1024 762 Rede Feminista de Juristas

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde emitiu nota técnica tratando o PLC nº 94/2018, que tenciona conceder a delegados e delegadas a competência para decidir sobre a concessão ou não de medidas protetivas a vítimas de violência doméstica.

Apesar de a proposta ter como objetivo, aparentemente, dar uma resposta a algumas das dificuldades apontadas por pessoas em situação de violência, em especial ao problema do tempo de demora para a efetivação das medidas protetivas de urgência, a Rede Feminista de Juristas – deFEMde constatou diversos pontos problemáticos no ato normativo, cuja aplicação pode culminar num cenário de maior desproteção dessas pessoas.

O PLC possui patente inconstitucionalidade por ofender o princípio da separação de poderes, uma vez que confere a um órgão do Poder Executivo uma competência que deveria ser somente jurisdicional. O texto constitucional não confere à polícia a função decisória, tampouco cautelar. Tal alteração poderá enfraquecer os efeitos da Lei Maria da Penha e causar insegurança jurídica às pessoas que tiveram suas medidas protetivas deferidas inconstitucionalmente por delegacia de polícia.

O projeto também desconsidera todo o histórico de construção e a estrutura da política estatal de enfrentamento à violência doméstica, além de falhar em elaborar um diagnóstico correto dos problemas que marcam essa política. Atribuir essa capacidade decisória à autoridade policial também desvirtua outros aspectos da Lei Maria da Penha, que é um olhar integral para a violência, a motivada aposta no atendimento multidisciplinar e a recusa dos mecanismos punitivos como única ferramenta à disposição das pessoas. Essa eventual modificação fere essas diretrizes ao descaracterizar o papel das autoridades policiais e desconsiderar aquele que deve ser desenvolvido por outros atores da rede de atendimento.

Essa medida pode levar ao aprofundamento da desproteção das pessoas, expondo-as a violências institucionais. E se desacompanhada de investimentos, essa medida pode se traduzir em precarização do trabalho policial. Em muitos locais, a polícia opera abaixo da capacidade estimada como ideal. Esses dois aspectos estão interligados – o sucateamento e a precariedade das condições de trabalho nas delegacias afetam diretamente a maior vítima dessa situação: as pessoas que dependem de atendimento de qualidade como mecanismo de efetivação de sua cidadania.

A ausência de legitimidade popular no Projeto de Lei sob análise muito preocupa, uma vez que não parece estar atendendo às demandas das mulheres em situação de violência doméstica e sim a interesses de categorias específicas.

Confira a nota técnica aqui.

deFEMde questiona proposta de alterações na Lei Maria da Penha

1024 409 Rede Feminista de Juristas

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde critica duramente as alterações em curso na Lei Maria da Penha, constantes no recém aprovado Projeto de Lei da Câmara nº 7, de 2016, que não levam em conta a realidade nas delegacias brasileiras, onde, comumente, as mulheres em situação de violência são desacreditadas e até mesmo desestimuladas a pedir uma medida protetiva ou dar andamento a uma ação penal.

Além disso, tais mudanças podem criar barreiras para que elas levem suas demandas ao Judiciário, tornando-as muito mais vinculadas à decisão da autoridade policial. A polícia, por estar incumbida de outras atribuições e por não ter contingente suficiente para cuidar especificamente dos casos de violência doméstica, pode não tratar as peculiaridades do caso concreto com o devido cuidado.

O projeto, enfim, ignora o parecer de entidades que atuam em defesa da mulher, contrariando a própria essência de participação popular que levou à criação da Lei Maria da Penha. A nota acima foi veiculada na reportagem do Programa Bom Dia Brasil.

Para mais informações sobre os problemas do Projeto, recomendamos a leitura do artigo “Alterações em curso na Lei Maria da Penha prejudicam mulheres”, de autoria de Stela Silva Valim, advogada criminalista e membra da Rede Feminista de Juristas (deFEMde), e publicado no Justificando:

deFEMde apoia criação de Vara de Violência Doméstica em Campinas

1024 682 Rede Feminista de Juristas

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde apoia e promove abaixo-assinado criado pelo Coletivo Parajás para implementação de Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher em Campinas-SP, que apesar de ser a 3ª maior cidade em população do estado, não possui o mecanismo.

A instalação de uma vara especializada é um mecanismo previsto na Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha), contribuindo para a devida aplicação do diploma legal contra a violência da mulher, bem como simboliza a garantia de um ambiente qualificado – onde as mulheres poderão se sentir mais seguras na tutela de seus direitos ameaçados em decorrência de violências sofridas.

A lei Lei foi criada após condenação do Estado brasileiro pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, visando prevenir, punir e coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, e estabelece a instituição destas varas especializadas para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher;

Diversas outras cidades pelo Estado de São Paulo já tiveram a instituição deste mecanismo, que é garantia legal e equipamento público dentro do Poder Judiciário indispensável para contribuir e somar na luta pela erradicação da violência de gênero no nosso município, oferecendo atendimento multidisciplinar especializado e garantindo melhor tramitação processual de casos envolvendo violência contra a mulher.

Assine a manifestação aqui.